quinta-feira, 4 de setembro de 2014

A fuga da dor como fuga da vida

por María del Prado Esteban

“Viver é lutar e a luta sempre é dolorosa.” Félix Martí Ibañez 


O uso de antidepressivos disparou em toda Europa, praticamente dobrou no último decênio. No Estado espanhol o consumo destes fármacos aumentou em 38%, porém o de hipnóticos e sedativos o fez em 66% e esse crescimento é, além disso, exponencial.

A utilização de psicotrópicos é especialmente aterradora entre as mulheres, ao menos 25% da população feminina toma algum narcótico para aliviar a dor de viver.

Não há dúvida de que a vida se tornou cada vez mais insuportável para um número crescente de pessoas e principalmente de mulheres. Segundo a Pesquisa Nacional de Saúde do Ministério de Sanidade e Consumo (Espanha), a depressão feminina passou de 6, 58% para 20, 49% entre 2003 e 2006. Isto quer dizer que o número de enfermas psíquicas [1] triplicou em apenas três anos, anos que foram, ademais, os das grandes campanhas institucionais a favor da mulher e da criação do primeiro Ministério da Igualdade.

O certo é que emerge uma nova personalidade débil, mole, egocentrada de forma narcisista, incoerente e minguada, cujas emoções não sustentam suas funções superiores, mas as anulam; que essa personalidade é muito mais comum entre o sexo feminino e que este sujeito, assim constituído, é um potencial viciado em substâncias psicoativas, sejam estas legais ou ilegais.

A verdade é, também, que tal indivíduo está sendo criado pela intervenção dos funcionários do Estado do bem-estar que incorporam cada vez mais pessoas ao seu protocolo de medicalização, convencendo assim seus pacientes que a vida não vale a pena ser vivida e que tudo o que podemos fazer é anestesiar o corpo [2] e a alma para não sofrer, não pensar e não sentir.

Enquanto as substâncias químicas nos envenenam o corpo, apareceu um novo mercado de narcóticos espirituais dirigidos de forma especial à população feminina, uma indústria que proporciona numerosos benefícios aos vendedores da cura milagrosa e da felicidade ao pé da letra. Cursos, oficinas e encontros que prometem uma beatífica apatia como paradigma da alegria e do otimismo. Estas drogas, tão nocivas como as primeiras, nos oferecem uma saída escapista da realidade e permitem que nossa vida autêntica siga se degradando enquanto fechamos os olhos e destruímos nosso mundo interior para converter-nos em autômatos sorridentes e apalermados, cegos frente ao horror da realidade circundante e à nossa própria condição.

Há uma grande tragédia na incapacidade moderna para a aceitação da dor, uma tragédia autêntica, porque esta fuga do mal-estar, paradoxalmente, aumenta até o infinito o padecimento pessoal e social. Renunciar ao sofrimento significa renunciar a muitas coisas fundamentais que dão sentido à vida. Significa:

1. A renúncia à consciência do mundo, da verdade e do real. O esforço para aproximar-se da verdade das coisas é amargo porque implica um trabalho árduo, ás vezes sobrehumano para superar as barreiras descomunais que o sistema impõe. A vitória sobre a mentira e o erro não é fácil nem cômoda, é dura e sofrida, nos condena a viver com consciência de nossas limitações e, muitas vezes, em meio a incertezas e dúvidas. Por outro lado, a defesa da verdade requer uma enorme dose de coragem e desprezo pela tranquilidade e pelo próprio bem-estar. Hoje, na sociedade da mentira obrigatória, os que lutam pela verdade estão condenados ao ostracismo, perseguição, opróbrio e humilhações sem limites. Quem quiser, pois, alcançar a realidade do mundo e tomar consciência da verdade das coisas, terá que aceitar a dor que isso traz.

2. Quem teme o sofrimento tem de renunciar ao amor. Todas as categorias de amor – o amor sexual, o amor maternal, o amor fraterno, o amor social, a amizade e o amor por convivência, todas – produzem em algum momento a angústia pela incompreensão, o medo da separação e do abandono, o sentimento de vulnerabilidade e dependência. Os vínculos e compromissos amorosos implicam esforço e sacríficio e a abnegação do interesse próprio. Se o amor é uma das experiências humanas mais sublimes e extraordinárias, não está isenta quase nunca, como tudo o que é sublime, do lado trágico. Nas condições atuais de destruição quase total das estruturas de vinculação e compromisso humano, a luta para reconstruir a convivência nos campos social e pessoal terá mais momentos dolorosos do que prazerosos.

3. Quem não está capacitado para o sofrimento não pode alcançar o conhecimento de si mesmo nem auto-construir-se como pessoa, porque todos somos seres divididos e o olhar dirigido ao nosso interior, se é valente e sincero, é doloroso. Quem não estiver disposto a aceitar a realidade de si mesmo por medo da angústia de ver seu lado obscuro, não pode desenvolver em si nem virtude nem excelência alguma, pois todo desenvolvimento implica negação, vazio e privação, e, portanto, desconforto. O medo da dor está nos convertendo em seres-nada esvaziados dos traços humanos de consciência, virtude, vontade e entrega.

4. Quem não está disposto ao sacrifício não pode resistir ao mal que avança inexorável em toda a sociedade, vê-se impelido a colaborar com ele ativa ou passivamente. Não pode, por isso, contribuir para a investida do bem, do justo, do belo e do sublime em todos os âmbitos da vida porque qualquer projeto de regeneração do humano implica em se expor a ser perseguido e intimidado em um tempo no qual o mal é forte e poderoso. Isso significa que quem não se sacrifica pelo bem do mundo está obrigado a viver dentro da iniquidade e a sofrê-la.

5. Tudo aquilo que é grande, transcendente, significativo, que tem projeção histórica, o que é valioso e excelente, é conflitivo e arriscado. Quem se acovarda perante a dor está condenado a viver no mesquinho e no insignificante, no cotidiano e banal, a entregar sua vida a atos inconsequentes e sem valor. Tudo o que é criativo, estético, belo e sublime exige um quinhão de padecimentos, a Arte com maiúscula desaparecerá de nossas vidas sufocada pelo bem-estar e, por conseguinte, estaremos obrigados a viver entre a fealdade e a aberração.

Sermos capazes de sofrer, mantermo-nos indiferentes diante da aritmética do prazer e do desprazer, é condição para a vida autêntica, para a liberdade e para a virtude pessoal. Esta capacidade hoje está desaparecendo da sociedade, mas de forma particular está sendo anulada entre as mulheres que somos conduzidas à uma deriva de estúpida harmonia interior que não é senão letargia e fraqueza diante do esforço de viver e de ser livres. Superar a dor da existência à base de drogas é o mesmo que renunciar à vida. Aqueles que nos vendem uma felicidade infalível e uma emancipação adulterada, sem luta, sem medo, sem suor e sem sangue, nos vendem uma mercadoria podre, simplesmente isso não existe.

***

[1] Pode entender-se este processo como um crescimento intenso do mal-estar objetivo e real das mulheres ou também como uma manobra das instituições de saúde para medicalizar e narcotizar as mulheres em massa com o pretexto de ajudá-las e protegê-las. Em minha opinião ambos os fatores se complementam e se potenciam um ao outro. 

[2] Nos EUA a morte de mulheres por abuso de analgésicos foi classificada por alguns especialistas como epidemia, a cada dia morrem 18 mulheres norte-americanas por essa causa e se considera que um a cada 10 suicídios tem relação com esse tipo de abuso.


domingo, 27 de abril de 2014

Levantar Peso Também é Assunto de Mulher!


Há muitas visões sobre o que pertence ao âmbito da feminilidade. Levantar pesos geralmente não é uma dessas coisas. Tradicionalmente, a fragilidade, delicadeza e suavidade são vistas como características do feminino, e a força, dureza e aspereza como características masculinas. Coisas que não podem coexistir. A maioria das pessoas imediatamente associam a prática de levantamento de pesos em suas diversas formas com o segundo grupo de termos.  "Ah, não, isso é uma coisa de homens. As mulheres não devem ser 'musculosas'."

Ao mesmo tempo, sempre se ouviu falar de mulheres fortes, valentes, poderosas e guerreiras. Desde as Valquírias até as onna-bugeishas, de Boudica a Rani Lakshmibai. Mulheres pegam em armas.

Mas seguindo com a tmática recorrente do blog, deparei-me com Atena e Ártemis.

Extraído da Wikipédia:

“Na mitologia grega, Atena é a deusa da guerra, civilização, sabedoria, estratégia, das artes, da justiça e da habilidade. Uma das principais divindades do panteão grego e uma dos doze deuses do Olimpo, Atena foi cultuada em toda Grécia Antiga e em toda sua área de influência… […] Assim como todas as outras divindades, que supostamente distribuíam as bençãos da natureza, era a protetora do crescimento das crianças, e como deusa do céu claro e ar fresco, dava saúde e afastava a enfermidade. [...] Como deusa sábia da guerra, também era a protetora de todos os heróis que se distinguiram pela sua prudência e bons conselhos, bem como por sua força e coragem, como Hércules, Perseu, Belerofonte, Aquiles, Jasão, Ulisses e Diomedes. Como deusa da guerra e protetora dos heróis, Atena aparece frequentemente com armadura, com a égide e um cajado dourado, com a qual otorga a seus favortias juventude e majestade."

"Na mitologia grega, Ártemis ou Artemisa [...] era a deusa grega da caça, animais selvagens, da terra virgem, dos nascimentos, da virgindade e das donzelas, que trazia e aliviava a doença em mulheres. É muitas vezes descrita como uma caçadora, carregando um arco e flechas. O cervo e o cipreste eram consagrados a ela. [...] Calímaco conta como Ártemis passou a infância buscando o necessário para ser uma caçadora, recebendo seu arco e flechas na ilha de Lipara, onde Hefesto e os Ciclópes trabalhavam. As filhas de Oceano estavam cheias de medo ao ver os ferreiros monstruosos, mas a jovem Ártemis bravamente se aproximou e solicitou suas armas."

As deusas gregas da guerra, caça, saúde e habilidade são mulheres. Eu não acho que isso é uma coincidência. Nós temos essas capacidades, que são inatas. Não somos bonecas frágeis, a menos que nos permitimos sê-las.

Eu vejo o progresso diário como uma necessidade. Pela prática constante de ações positivas, seguimos em frente afim de atingir um objetivo e atingir a excelência. Na mente, corpo e alma. É difícil não concordar com esses sentimentos gerais. No entanto, a ideia de possuir um corpo cultivado parece assustar a maioria das mulheres – elas pensam que se converterão imediatamente em enormes fisiculturistas. Por causa desses medos infundados, são privadas de uma melhora imensa em seu bem-estar.

Creio que é hora de esclarecer alguns mitos que cercam o exercício físico. Neste artigo de Nerd Fitness, vemos a história de uma jovem chamada Staci, que começou a levantar pesos com seriedade e transformou sua vida, seu corpo, sua mente, em todos os âmbitos, e hoje leva um estilo de vida infinitamente mais saudável.

Por que levantar pesos? Obviamente, não é a única maneira de alcançar o físico atlético e firme tão desejado que as modelos de fitness têm. Muitos esportes também conduzirão a esse resultado. Mas musculação é um dos meios mais práticos e simples. Não é a minha ideia sugerir que é necessário atingir os níveis de competição de elite nem transmitir esse nível de dedicação. Com um programa básico como Starting Strength (o recomendado para iniciantes), de três horas por semana e alguns movimentos básicos são mais que suficientes para obter os imensos benefícios dessa atividade. Deve-se segui-lo ao pé da letra, nada mais. Sim, é preciso levá-lo a sério. Nada de perder horas e horas sobre as bicicletas e ginástica localizada. Ao concentrar-nos em ser mais aptas fisicamente, mais fortes, nossos corpos adaptam-se à tarefa. Nossa rotina diária adapta-se a fim de alcançar a mudança. Nossa massa muscular cresce, a gordura é queimada. Levantando pesos ​​com poucas repetições gera músculo denso. A força que ganhamos é  transmitida para as tarefas da vida diária – cuidar da casa, carregar bolsas e correr atrás de um ônibus serão coisas simples em vez de nos fazer suar ou procurar ajuda de outros. Se a pessoa pratica esportes ou é dançarina, seu desempenho certamente melhorará com levantamento de pesos. Levantar pesos contribui para a densidade óssea e flexibilidade das articulações.

E o que ganhamos além disso? O treinamento obriga-nos a ter uma alimentação saudável e a dormir bem. Caso contrário, estaremos perdendo tempo, porque o nosso corpo não consegue recuperar-se do esforço ao qual o submetemos. O artigo propõe a dieta "Paleo", como a melhor opção, e apesar de estar de acordo por causa de seu alto potencial de saciedade, não é a única maneira de conseguir atingir uma alimentação saudável (pode ser relativamente cara – outros verão como mais simples seguir uma dieta tipo keto, outros acham melhor uma dieta com baixo teor de gordura). Sem seguir uma dieta tão estritamente, nada  melhor como comer alimentos naturais e inteiros – nada de lixos processados cheios de conservantes e açúcar –  e assegurar que a ingestão de proteínas é o ideal, além de controlar um pouco as porções e calorias consumidas (cerca de 1800-2000 por dia), cumprindo assim os requisitos. Mantendo esse nível de calorias, é impossível, repito, impossível de se tornar musculosa como um fisiculturista. Simplesmente, não temos o mesmo nível de hormônios no sangue que permitem os homens atingir esse físico – uma mulher deve incorporar muitas calorias e usar suplementos e drogas. Repito: ninguém vai ter um físico de competição "sem querer". Os músculos que geramos são os que temos a capacidade natural de gerar e controlamos eles através de uma dieta saudável. Os tecidos muscular e adiposo não são construídos do nada, você precisa consumir para permitir a formação. 

E também, necessitamos disciplina, consistência, capacidade de fixarmos objetivos a cumprir e tomar o caminho necessário para atingir esses objetivos – e para fazer correções se não observarmos resultados.
Começamos, então, a ver os benefícios – somos mais fortes porque levantamos pesos, mais saudáveis ​​porque comemos melhor e dormimos mais, mais disciplinadas e dedicadas porque essa atividade requer muitos meses, ou mesmo anos de esforço, mais sábias porque nos educamos e aprendemos a nos alimentar (e também a alimentar nossas famílias!), mais felizes por causa das endorfinas que o exercício produz. O corpo ganha uma aparência firme e com contornos como expressão de mudanças internas. O corpo, espírito e mente são melhorados. Isso tem um impacto positivo em todos os níveis de nossas vidas, as lições que aprendemos transformando nossos corpos podemos levar como lições para qualquer outra coisa – sem mencionar que o exercício pode ser uma excelente maneira de canalizar o estresse, a depressão, raiva e outras emoções negativas em algo positivo.

Essa foi minha experiência também, e depois de muito tempo lutando contra transtornos alimentícios e desgastando-me ao perguntar porque as horas e horas de esteira e as dietas que me deixavam passando fome não adiantavam, sentindo-me gorda e odiando o quanto eu estava fraca e deprimida por isso, descobri o erro dos meus métodos. A balança não te conta toda história: o ponto crucial está na composição do corpo e a musculação é o método mais simples de mudá-la. Por isso quero compartilhar isso com vocês.

Giuliana,
Círculo Atenea Argentina

quinta-feira, 6 de março de 2014

A terra dos Tzares em cores: fotografias da Rússia de um século atrás.


Fotografias surpreendentes, capturadas em cores vivas, mostram a vida na Rússia no início de 1900 quando o país estava à beira da Primeira Guerra Mundial - e da revolução.
[Imagens pelas lente e técnica de Sergei Mikhailovich Prokudin-Gorskii, em visita a sua terra natal.]


The photographer was commissioned by Tsar Nicholas II to travel around Russia capturing images of the nation in the early years of the 1900s, in full colour


An Armenian woman in national costume poses for Prokudin-Gorsky on a hillside near Artvin (in present day Turkey)


In order to capture the scenes in colour, Prokudin-Gorsky had to take three photos, each time with a different colour filter over the lens, which meant that sometimes, when subjects moved, the colours would blur and distort - as seen in this image


Self-portrait: Prokudin-Gorsky's method resembles modern nature shots. He is pictured here surveying the Russian landscape


A group of women in Dagestan pose for a photo. Prokudin-Gorsky was charged with capturing the faces and landscapes of Russia


The extraordinary photos capture the landscapes of Russia at the beginning of the 20th century in vivid colour


Historical Russian photos by Sergey Prokudin Gorsky
Historical Russian photos by Sergey Prokudin Gorsky


Prokudin-Gorsky began implementing his three-colour method after studying under German photochemist Adolf Miethe


After leaving Russia in 1918, Prokudin-Gorsky moved to Germany, where he remarried and had a daughter, Elka. He then moved to Paris and was reunited with his first wife and three adult children, with whom he started a photography studio


The tsar granted Prokudin-Gorsky access across the nation and provided with a railway car equipped with a dark room


Prokudin-Gorsky was one of the most famous photographers in Russia at the beginning of the 20th century


A group of Jewish children with their teacher: The vivid colours in the boys' coats are preserved for the historical record due to Sergey Prokudin-Gorsk's three-colour method



Boathouse: Prokudin-Gorsky took photos of the country as it was about to enter WWI and then a revolution. But he still captured moments of tranquility and beauty


Historical Russian photos by Sergey Prokudin Gorsky
Historical Russian photos by Sergey Prokudin Gorsky


Two parents and their three daughters rest in a field as the sun sets, their agrarian way of life would be ruthlessly shut down in coming decades, as forced industrialisation occurred across the nation


After the revolution in 1917, the photographer was offered the position of professor at a university, but left the country a year later. He moved to Germany and then to Paris


A man moulds an artistic casting. This photo, taken in the Kasli Iron Works in 1910, comes from the album Views in the Ural Mountains, survey of industrial area, Russian Empire


Historical Russian photos by Sergey Prokudin Gorsky
Historical Russian photos by Sergey Prokudin Gorsky


Russian church: A view of the Nikolaevskii Cathedral  in Mozhaisk in 1911


The photographer (front right) poses on a handcar outside Petrozavodsk on the Murmansk railway along Lake Onega


Can't sit still: This image shows how difficult it was to capture colour at the time. If any of the children moved while the three different photographs were taken the colour would blur


Sergey Prokudin-Gorsky was one of the most famous photographers in Russia at the time. He was the editor of the country's leading photographic journal and continued to contribute to journals around the world once he left Russia


A wealthy woman poses outdoors on a magnificent rug in a richly ornamented outfit and headdress


Here, Sergey has captured a Sart woman in Samarkand, Uzbekistan. Until the Russian revolution of 1917, ¿Sart¿ was the name for Uzbeks living in Kazakhstan

A shepherd boy on the Sim River in the Ural Mountains is pictured here, resting in 1910


Almost half of the negatives produced by the photographer during his tour of Russia were confiscated when he left the country after the Russian revolution


Workers and supervisors pose for a photograph amid preparations for pouring cement for sluice dam foundation across the Oka River near Beloomut in 1912

The pictures show the diversity of the Russian landscape at the beginning of a tumultuous century for the nation


Prokudin-Gorsky died in Paris in 1944, a month after the city was liberated from Nazi occupation


Rural scene: A group of people rest in the middle of a field. They have a tea pot and refreshments and look like they have stopped for a picnic or lunchbreak


Fonte:
Mail Online [ 
Land of the Tzars in colour: Fascinating photographs show the people and places of pre-revolutionary Russia]

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Contos e Iniciação

Por Mircea Eliade*


               
                  A coexistência, a contemporaneidade dos mitos e dos contos nas sociedades tradicionais, suscita um problema delicado mas não insolúvel. Pode-se pensar nas sociedades do Ocidente medieval, em que os místicos autênticos se encontravam submersos na massa dos simples crentes e mesmo misturados a alguns cristãos cuja falta de devoção chegara a um ponto tal, que não mais participavam do cristianismo, senão exteriormente. Uma religião é sempre vivida – ou aceita e suportada – em diversas gradações; mas, entre esses diferentes planos de experiência, há equivalência e homologação. A equivalência se mantém mesmo após a “banalização” da experiência religiosa, após a (aparente) dessacralização do mundo. (Para nos convencermos, basta analisar as valorizações profanas e científicas da “Natureza”, depois de Rousseau e da filosofia do iluminismo). Hoje, entretanto, reencontramos o comportamento religioso e as estruturas do sagrado – figuras divinas, gestos exemplares, etc. – nos níveis profundos da psique, no “inconsciente”, nos planos do onírico e do imaginário. 

                Isso suscita um outro problema, não mais de interesse do folclorista ou do etnólogo, mas que preocupa o historiador das religiões e que acabará por interessar o filósofo bem como, possivelmente, o crítico literário, pois também diz respeito, se bem que indiretamente, ao “nascimento da literatura”. Embora, no Ocidente, o conto maravilhoso se tenha convertido há muito tempo em literatura de diversão (para as crianças e os camponeses) ou de evasão (para os habitantes das cidades), ele ainda apresenta a estrutura de uma aventura infinitamente séria e responsável, pois se reduz, em suma, a um enredo iniciatório: nele reencontramos sempre as provas iniciatórias (lutas contra o monstro, obstáculos aparentemente insuperáveis, enigmas a serem solucionados, tarefas impossíveis, etc.), a descida ao Inferno ou a ascensão ao Céu (ou – o que vem a dar no mesmo – a morte e a ressurreição) e o casamento com a Princesa. É verdade, como justamente salientou Jan de Vries, que o conto sempre se conclui com um final feliz. Mas seu conteúdo propriamente dito refere-se a uma realidade terrivelmente séria: a iniciação, ou seja, a passagem, através de uma morte e ressurreição simbólicas, da ignorância e da imaturidade para a idade espiritual do adulto. A dificuldade está em determinar quando foi que o conto iniciou sua carreira de simples história maravilhosa, decantado de toda responsabilidade iniciatória. Não se exclui, ao menos para certas culturas, que isso se tenha produzido no momento em que a ideologia e os ritos tradicionais de iniciação estavam em vias de cair em desuso e em que se podia “contar” impunemente aquilo que outrora exigia o maior segredo. Não é de todo certo, entretanto, que esse processo tenha sido geral. Em grande número de culturas primitivas, nas quais os ritos de iniciação permanecem vivos, as histórias de estrutura iniciatória são igualmente contadas, e o vem sendo há longo tempo. 

                Poder-se-ia quase dizer que o conto repete, em outro plano e através de outros meios, o enredo iniciatório exemplar. O conto reata e prolonga a “iniciação” ao nível do imaginário. Se ele representa um divertimento ou uma evasão, é apenas para a consciência banalizada e, particularmente, para a consciência do homem moderno; na psique profunda, os enredos iniciatórios conservam sua seriedade e continuam a transmitir sua mensagem, a produzir mutações. Sem se dar conta e acreditando estar se divertindo ou se evadindo, o homem das sociedades modernas ainda se beneficia dessa iniciação imaginária proporcionada pelos contos. Caberia então indagar se o conto maravilhoso não se converteu muito cedo em um “duplo fácil” do mito e do rito iniciatórios, se ele não teve o papel de reatualizar as “provas iniciatórias” ao nível do imaginário e do onírico. Esse ponto de vista surpreenderá somente aqueles que consideram a iniciação um comportamento exclusivo do homem das sociedades tradicionais. Começamos hoje a compreender que o que se denomina “iniciação” coexiste com a condição humana, que toda existência é composta de uma série ininterrupta de “provas”, “mortes” e “ressurreições”, sejam quais forem os termos de que se serve a linguagem moderna para traduzir essas experiências (originalmente religiosas).



*Trecho retirado do livro Mito e Realidade, Apêndice I, “Os Mitos e os Contos de Fadas”.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

As guerreiras da Asgarda


guerreras de asgarda 3

Katerina Tarnovska é uma professora de pré-escola ucraniana, uma campeã mundial de kickboxing e ela ainda se declara descendente das lendárias amazonas. Em 2002, ela fundou a Asgarda, uma arte marcial exclusivamente para mulheres inspirada nas tradições tribais das amazonas citas. Na década passada, mais de mil mulheres foram encarregadas de difundir os ensinamentos da Asgarda, que Katerina diz ser o único estilo de luta especificamente desenvolvido para a forma feminina.
A influência de Katerina vai muito além de ensinar as mulheres a transformar seus corpos em armas mortais. Ela já escreveu vários livros instrucionais sobre a Asgarda, compôs incontáveis músicas folclóricas com temática amazona e produziu vídeos de aeróbica nos quais ela, que tem 34 anos, parece uma mistura de Jane Fonda e Tank Girl, se exercita ao som de uma versão ucraniana do Rammstein.
Recentemente, eu me juntei a uma das sessões de treinamento da Asgarda nas Montanhas Cárpatos, que são mais ou menos como acampamentos de verão só para garotas, mas com aulas nas quais as meninas aprendem a usar sabres, machados e citas em vez de fazer artesanato. Antes de encontrar Katerina, eu imaginei que a gente discutiria principalmente como é ser uma mulher na sociedade patriarcal ucraniana — o parlamento do país é 90% masculino e a violência doméstica é um grande problema. Mas ela estava mais inclinada a falar sobre como ganhar o coração de um guerreiro, algo fundamental para realizar seu estranho plano nacionalista de começar uma nova geração de guerreiros ucranianos.
Entrevistadora: Como a Asgarda começou?

Katerina Tarnovska (Asgarda): Quando descobri que as amazonas existiram em nosso território, cheguei à conclusão de que o espírito delas tinha sido passado geneticamente para as mulheres ucranianas. Foi o espírito com o qual nasci. A casta guerreira ucraniana foi destruída, pouco restou disso. E o renascimento da casta depende da capacidade das mulheres em criar garotos que venham a se tornar guerreiros. Foi dessa ideia que se formou a Asgarda. Como uma pessoa envolvida profissionalmente em artes marciais, esse era meu caminho, o caminho do guerreiro.
Mas as amazonas não odiavam os homens e queriam matá-los?

Não. Homens que tinham medo delas, especificamente os gregos antigos, escreveram esses mitos sobre mulheres cruéis porque as amazonas com frequência lutavam contra eles, e alguns mitos dizem que os gregos perderam. Indo até a fonte histórica, você vai descobrir que as amazonas amavam os homens, se casavam e tinham filhos com os citas. Eu posso dizer, com confiança, que sou uma amazona, e que isso não me impede de me apaixonar e ter filhos.
Você diria que a Asgarda é um movimento que visa dar poder às mulheres?

Sim. É importante para homens e mulheres se aceitarem em bases iguais, mas isso não significa que somos a mesma coisa. A Asgarda é uma plataforma para desenvolver as garotas de maneira harmoniosa por meio das artes marciais e fortalecer a posição delas dentro da sociedade, assim, elas podem se realizar dentro de suas famílias, negócios ou da política; no entanto, em casa com seu marido, uma mulher tem que ser uma mulher.

O que isso quer dizer?

Na sociedade, você conquista coisas para si mesma, mas na família, o desafio é encontrar nossa força na tolerância e no amor. Nos relacionamentos, a mulher tem um papel muito importante. Quando ela está com seu marido, ela precisa fazer ele se sentir como um homem. Assim não haverá nenhum problema.
E como você faz um cara se sentir homem?

Primeiro, você o encanta e ele quer ficar com você porque vê uma rainha. Mas como os cavaleiros de verdade, os homens querem conquistar, vencer. Você precisa fazer o homem sentir que conquistou você. Então, primeiramente, você precisa dar essa sensação a ele e continuar com isso de tempos em tempos. Segundo, você não pode deixar o homem ficar muito confortável, porque assim que ele começa a te considerar como ganha, ele vai querer conquistar outra rainha. Então, a mulher deve permanecer sempre como uma rainha, estar constantemente encantando seu homem e lembrando que ele precisa conquistá-la. Somente a mulher pode alcançar esse equilíbrio, um homem é incapaz disso.
Isso não significa colocar toda a responsabilidade por um relacionamento saudável sobre a mulher?

Olhe, é assim que mulheres fortes como nós vão conquistar um guerreiro. Esse equilíbrio funciona. Hoje, as mulheres em geral entendem isso errado. Elas querem impressionar seus parceiros e, às vezes, competir com eles, mas isso faz o homem se sentir fraco. Obviamente, há homens que não querem conquistar, mas eles vão querer uma rata, não uma guerreira.
Muitas mulheres podem achar esse tipo de dinâmica fora de moda e injusta.

Desde os tempos antigos o homem tem sido o caçador, o guerreiro que conquista e sustenta o lar, e a mulher tem sido a defensora da família e a pessoa no comando da casa. Ela cria todo o amor na família para que as crianças possam se desenvolver e para que o homem possa progredir e trazer os troféus conquistados pelo mundo para casa. Isso dá a ela a oportunidade de se desenvolver. Porque quando um homem vai caçar, a mulher não precisa se preocupar em como alimentar a família. O mundo foi criado assim e é preciso viver com as leis da natureza. Se formos contra as leis, vamos sofrer.
Mas agora temos supermercados e não vivemos mais em cavernas...

Toda mulher forte é, no entanto, uma mulher. É algo que você nunca pode esquecer. É algo para se alegrar e desenvolver juntamente com suas forças. Levou muito tempo para que eu entendesse a frase “A força da mulher é sua fraqueza”. Sim, sou uma mulher forte. Sim, eu treino. Sim, eu luto. Sou uma excelente organizadora. Sou uma boa líder e uma pessoa que já leu muito. Mas num relacionamento, eu vou mostrar minha fraqueza.
Você é casada?

Eu era, mas agora sou divorciada. Ele não conseguiu lidar com minhas aspirações de me tornar uma campeã mundial de kickboxing. Mas isso era meu sonho desde a infância, então, precisei fazer uma escolha. Você precisa encontrar um homem mais forte do que você, porque só assim ele saberá lidar com suas ambições. Preciso de um homem muito forte, o que é difícil de encontrar. Mas tenho confiança de que o amor vai cruzar meu caminho de novo.
Se você tivesse um namorado e vocês dois tivessem uma luta, quem venceria?

Eu venceria. Se ele me amasse, ele me deixaria ganhar.
Você se incomoda com a taxa de desemprego tão alta entre as mulheres ucranianas?

A razão para o alto desemprego das mulheres é porque muitas fábricas fecharam e os trabalhos que restaram exigem força física, então, é mais fácil para os homens conseguir empregos. Ainda assim, acho que se uma mulher quer realizar seu potencial, ela sempre tem a habilidade para fazer isso. Todas as minhas amigas trabalham.
A Ucrânia também tem uma taxa aterrorizante de abuso contra mulheres. É por isso que você ensina autodefesa a essas garotas?

Quando os homens não conseguem se realizar, eles bebem muito, o que leva à violência doméstica. O alcoolismo é um problema grave na Ucrânia. Sim, se defender nas ruas e em casa contra agressões é importante. Quando minhas garotas da Asgarda completam 14 anos, conversamos sobre como um homem deve ser, treinamos elas para ver se o garoto de que gostam é um homem ou só uma pessoa do sexo masculino.
Como você sabe que um homem é um homem de verdade?

Uma pessoa do sexo masculino é egoísta e não consegue completar sua missão masculina fora a parte sexual. Um homem de verdade tem uma missão; ele precisa saber como ganhar dinheiro para sustentar sua família e defender a honra dela. Mais importante, ele precisa ter um estilo de vida saudável. Quando as garotas fazem 18 anos e começam a gostar de um cara, eu faço a elas uma pergunta simples: você quer apenas fazer sexo com ele por satisfação física ou você quer que seus filhos tenham os genes desse cara? Quando elas respondem, isso se torna algo simples. A Asgarda treina guerreiras para restaurar a casta dos guerreiros na Ucrânia, logo, as garotas precisam saber com que tipo de homem elas devem casar e ter filhos.
Por que restaurar a casta dos guerreiros é tão importante para você?

Se você não ama e não quer defender seu país, a próxima geração não vai ter orgulho de suas origens e vai querer ir embora em vez de ficar e fazer o país florescer. O amor de uma pessoa por seu país é passado através do leite materno.
Você se considera uma feminista?

Aqui eu preciso perguntar o que você quer dizer com feminista. Em nosso país, entendemos que o feminismo acredita que as mulheres são completamente independentes e que a influência dos homens é negativa.
Para mim, feminismo significa que homens e mulheres devem ter direitos iguais. O que você descreveu é o que eu chamaria de feminismo radical.

Se o feminismo visa defender a posição da mulher na sociedade, então sou feminista. Mas se o feminismo significa que as mulheres são os seres mais fortes e que devem se voltar contra os homens, então não, não sou feminista. Acredito na ordem natural das coisas. A missão da mulher é ter filhos.
Mas e se você não quiser ser mãe? E se houver muitas outras coisas importantes para você, como a carreira e a liberdade pessoal?

Para ter uma vida saudável e feliz, uma mulher precisa atingir algo por si mesma primeiro, claro. A autorrealização é importante. A mulher só estará pronta para a vida em família quando atingir seu pleno desenvolvimento pessoal, só então ela será capaz de passar sua sabedoria para os filhos.
FONTE: VICE